PARECER SOBRE REVISÃO DA PROPOSTA DE GESTÃO DA APA APRESENTADA PELA WALM PARA DISCUSSÃO
1.      Resumo da Proposta
O documento apresentado pela Walm inicia por discorrer acerca dos conceitos genéricos sobre governança e gestão de unidades de conservação, elucidando  as diferenças entre elas, de forma a servir como base para a proposta de gestão da APA de Campinas.
Define “gestão” como os meios e ações utilizados para alcance dos objetivos/missão/visão da Unidade de Conservação e orientações estabelecidas no Zoneamento e Programas de Gestão da UC. Propõe que a gestão envolva o diálogo e a cooperação entre diferentes instituições, grupos de interesse (partes interessadas) e indivíduos, sob a orientação do órgão gestor da APAe a partir de diretrizes normativas e orientações “do quê” e “como fazer” no território da APA.
A governança, segundo o documento, “se relaciona aos processos de tomada de decisões, da divisão de responsabilidades entre as instituições e grupos envolvidos na UC na própria construção e aprovação deste Plano de Manejo, a garantia dos investimentos de recursos humanos, materiais, políticos e financeiros para cumprimento dos objetivos de manejo e aplicação das normas, bem como a prestação de contas e transparência das ações, de forma colaborativa com a sociedade”.
Envolveria também a decisão de: “estabelecer a forma de monitorar, avaliar e ajustar o plano de manejo e o processo de implementação à luz dos resultados”. Isso é denominado “GESTÃO ADAPTATIVA”.
Na sua proposta, a Walm apresenta duas vertentes de governança e gestão complementares para a APA de Campinas, que estão em sintonia com a proposta do CONGEAPA, nos seguintes termos:
A primeira vertente, denominada de Governança Compartilhada e Adaptativa, está representada pelo Órgão Gestor Técnico e Administrativo – OGTA, formado por uma equipe técnica especialista, apoio administrativo, jurídico e financeiro, e com a participação do CONGEAPA – Conselho Gestor (Plenário) e Câmaras Técnicas.
A segunda vertente é denominada de Governança Institucional e representa as ações de gestão desenvolvidas pela Prefeitura Municipal de Campinas em território da APA.
Segundo a interpretação da Walm, há pressupostos técnicos-jurídicos que implicariam na mudança do sistema de gestão e governança que hoje existe na APA.
Assim, propõe que:
a)      a gestão da APA fique a cargo de órgão executor municipal;
b)      que o Conselho Gestor da APA (CONGEAPA) seja paritário e deliberativo;
c)      que a presidência do CONGEAPA seja do “Chefe da Unidade de Conservação”, ou seja, de um servidor público indicado, pertencente ao órgão executor municipal.
As seguintes câmaras técnicas são propostas: Gestão da Infraestrutura (Saneamento, Habitação Social e Sistema Viário); Atividades Rurais; Biodiversidade; Recursos Hídricos; Turismo Sustentável; Patrimônio Histórico Cultural e Arquitetônico.
As atribuições e responsabilidades da PMC, são descritas no item 2.1.1. As atribuições e responsabilidades do OGTA estão redigidas nos itens 2.1.2 e 2.1.3.
Sobre a aprovação de intervenções na APA, a Walm propõe que as atividades listadas como admissíveis e que integram as indicações de uso na APA de Campinas, devam passar por “autorização direta (AD)” do órgão gestor e conforme orientações e anuência do Congeapa.
Recomenda, ainda, que essa AD seja feita por acordo entre o interessado/proponente e a APA de Campinas (representada pelo órgão gestor), com a definição de responsabilidades, previsão de prazos para implantação da(s) atividade(s) autorizadas e medidas de monitoramento.
Segundo a proposta, o que se busca é “o registro técnico do processo, a revisão e aprimoramento contínuo, conforme os preceitos da governança compartilhada e adaptativa”.
Em linhas gerais, esta é a proposta apresentada pela empresa.
2.      Avaliação da Proposta de gestão da APA de Campinas
2.1 Modelo de Participação (CONGEAPA – Plenário e Câmaras Técnicas)
O modelo de participação proposto usa o mesmo conceito da construção do atual Plano de Manejo, onde o CONGEAPA é proponente e compõe a equipe de aprovação de etapas do Plano de Manejo, fazendo o controle do Plano de Trabalho e contribuindo com sua experiência histórica gestão da APA de Campinas.
No entanto, hoje o CONGEAPA tem caráter deliberativo e elege seu presidente entre seus pares. Está constituído de forma tripartite (de acordo com o RI), com representantes dos órgãos públicos e pelo Órgão Gestor Técnico Administrativo – OGTA (1° setor), representantes da população residente (2º setor) e organizações técnico e sociais organizadas (3º setor).
Sua função é garantir o cumprimento das normas e diretrizes do território da APA (ver no PM), acionar o OGTA quando do não cumprimento do PM, participar da efetivação das diretrizes gerais do PM e do acompanhamento da elaboração e execução dos programas, elaborar seu RI, Instituir as Câmaras Técnicas e aprovar os documentos e programas encaminhados pelo GTA, entre outras.
Discordamos veementemente do presidente do Conselho ser um servidor público nomeado pela administração, sem que seja eleito pelos pares, entendendo isso como um retrocesso. A votação para presidente deve continuar a ser pelo processo democrático através da eleição pelos conselheiros.
Historicamente, todas as vezes que um funcionário público assumiu a presidência do CONGEAPA, mesmo que pelo processo da eleição, o que se percebeu foi que as pautas eram dirigidas prioritariamente aos interesses políticos dos gestores que ocupavam o governo municipal.
A pauta e as informações privilegiadas passam a ser controladas pelo presidente do Conselho. Ele responde publicamente para a imprensa e exerce uma posição “diferenciada”. Os conselheiros são voluntários e não têm acesso a todos os trâmites que antecedem a proposta de pauta e a AGO. Os Conselhos existem para que a sociedade seja ouvida.
No caso da APA, a sociedade civil tem um único veículo para participar e se manifestar sobre as políticas públicas propostas. Os principais e maiores impactos ambientais negativos ocorridos no território são obras públicas. Precisamos fortalecer as organizações sociais se pretendemos preservar e defender o território da APA.
O funcionário público não tem a isenção necessária para presidir o Conselho, pois é instruído a respeitar e seguir as decisões dos seus superiores. Seu voto segue a política estabelecida para aquele governo, e pudemos ver claramente dentro do Conselho ou o esvaziamento, ou o primeiro setor votando em bloco favoravelmente a uma proposta em acordo com a administração municipal, mesmo sendo de impacto negativo na APA. Vide recentemente a represa de Sousas.
A proteção ambiental sempre acaba relegada ao segundo plano quando se esbarra nos interesses econômicos. A proximidade dos governantes municipais com os empresários locais e financiadores de campanha oferece risco permanente de alteração nos mecanismos de proteção da APA de Campinas.
Se queremos de fato proteger a APA de Campinas temos de fortalecer o controle da sociedade civil sobre o Plano de Manejo e, consequentemente, entre as ações e projetos da PMC e os Programas executados pela Governança Compartilhada e Adaptativa.
Deve-se lembrar que a participação da sociedade civil na gestão da APA de Campinas não é uma mera concessão do Poder Público Municipal, mas uma imposição constitucional, regulada pela lei federal de criação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação e demais normas aplicáveis.
Somente com a efetiva participação social tornam-se legais as aprovações e medidas de gestão no território da APA.   
Assim, com a necessidade de relação sinérgica entre as duas vertentes de governança, definimos como prioridade manter o CONGEAPA, que está constituído desde 2002, com seu Regimento Interno atualizado em 2018, como órgão de Controle e Parceiro sobre a gestão dos Usos e Atividades no território da APA de Campinas, de acordo com o Plano Local de Gestão da Lei 10.850, e, futuramente, com o Plano de Manejo.
2.2 Competências do CONGEAPA e sistema de aprovação
Sobre os itens 2.1.1 e 2.1.2/2.1.3, que descrevem as competências atribuições e responsabilidades) da Prefeitura de Campinas e do Órgão Gestor Técnico Administrativo, estamos de acordo com o listado.
Hoje, entre outros, o CONGEAPA delibera sobre:
  • Todos os protocolos referentes à APA;
  • Propostas urbanísticas incidentes sobre o território da APA;
  • Propostas de alteração no macrozoneamento, de perímetro urbano e rural do território da APA;
  • Propostas de alteração do Plano de Manejo;
  • Todas as questões ambientais que envolvam proteção da APA;
  • Acompanha a dotação orçamentária destinada à APA de Campinas e sua aplicabilidade e deve aprovar o relatório financeiro anual.
Somos favoráveis a que se estabeleçam critérios (por porte de atividade, nível de impacto e/ou outros) para classificar que tipo de protocolos de aprovação estarão dependentes da deliberação do CONGEAPA.
Da mesma forma que – independentemente de qualquer critério estabelecido – somos favoráveis a que todos os pedidos de aprovação relacionadas a novos parcelamentos do solo (loteamentos ou desmembramentos) ou  condomínios e à regularização fundiária dos existentes, ou ainda, a implantação de atividades que, na prática, impliquem em alteração do zoneamento, estejam sujeitas às deliberações do CONGEAPA.
2.2.1        Das Câmaras Técnicas
Além da relação de Câmaras Técnicas (CT) apresentadas pela WALM, propomos a inclusão de mais uma Câmara Técnica, voltada às aprovações objeto de deliberação do CONGEAPA. Denominamos “CT – Aprovação e Monitoramento”.
A criação desta nova CT se justifica porque, sabemos, é por meio das intervenções no meio físico que o Plano de Manejo mais firmemente se impõe, razão pela qual quis a legislação federal que o Conselho Gestor das APAs tivesse natureza deliberativa em relação a essas aprovações.
Portanto, é na avaliação e aprovação de intervenções, de novos empreendimentos e na regularização dos existentes ou na implantação e na regularização de atividades, onde reside o principal fundamento da existência do Conselho Gestor da APA, ainda mais, no contexto de governança compartilhada e adaptativa.
Diferente do alegado pela Walm, sobre impedimentos legais em relação à presidência do CONGEAPA, indicamos que a presidência dessa Câmara Técnica deva ser ocupada por representante da sociedade civil, escolhido entre seus pares, conforme tradição histórica e cultural deste Conselho, de forma a fortalecer o controle da sociedade civil sobre o Plano de Manejo. Neste caso, não há como se falar em qualquer óbice legal.
Assim, as aprovações dos processos e matérias sujeitas à deliberação do CONGEAPA deverão, previamente, ser submetidas à decisão da Câmara Técnica de Aprovação e Monitoramento, antes do envio ao Plenário para ratificação – ou não – da decisão.
2.2.2        Da Autorização Direta (AD)
Sobre o processo de aprovação a Walm propõe:

Caixa de texto: “As atividades listadas como admissíveis e que integram as indicações de uso na APA de Campinas, deverão passar por autorização direta (AD) do órgão gestor e conforme orientações e anuência do Congeapa. Recomenda-se que essa AD seja feita por acordo entre o interessado/proponente e a APA de Campinas (representada pelo órgão gestor), com a definição de responsabilidades, previsão de prazos para implantação da(s) atividade(s) autorizadas e medidas de monitoramento. Busca-se, assim, o registro técnico do processo, a revisão e aprimoramento contínuo, conforme os preceitos da governança compartilhada e adaptativa.”

Sobre este assunto, avaliamos que tanto as atividades objeto de Autorização Direta (AD), quanto aquelas cuja aprovação dependa da deliberação do CONGEAPA, por meio da Câmara Técnica de Aprovação e Monitoramento e ratificação pelo Plenário, devam ficar sujeitas à celebração de acordo prévio – nos temos propostos pela Walm.

Salientamos que tais acordos devem ser firmados por meio de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), entre o interessado e o Município de Campinas, conforme previsto no §6º do Artigo 5º da Lei Federal nº 7.347/85, in verbis:

Caixa de texto: “§ 6º Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante combinações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.” Os Termos de Ajustamento de Conduta são o instrumento pelo qual “o órgão público legitimado à ação civil pública toma do causador do dano – ainda quem em potencial – a interesses difusos, interesses coletivos ou interesses individuais homogêneos o compromisso de adequar sua conduta às exigências da lei, mediante cominações, que têm o caráter de título executivo extrajudicial[i].”

Em outras palavras, é o instrumento eleito pela Lei para prevenir, interromper ou buscar indenização em processos relacionados a danos ambientais.
Considerando que o TAC é importante instrumento de prevenção de danos e que Município, autarquias ou fundações públicas são legitimados a propor Ação Civil Pública, nada mais próprio e razoável que o acordo proposto pela Walm se efetive por meio da sua celebração.
Da mesma forma que nos casos de Autorização Direta, tambémas obras e atividades sujeitas à deliberação do CONGEAPA devem ser objeto de TAC prévio à sua execução, nos moldes fixados pela Câmara de Aprovação e Monitoramento.
Assim, do processo de aprovação deverá constar a relação de responsabilidades, a previsão de prazos para implantação e as medidas de monitoramento, além de outras considerações que a CT- Aprovação e Monitoramento ou o Plenário do CONGEAPA julgarem necessárias.    
2.2.3 Das Obras Públicas   
Conforme justificado acima, é na implantação de obras públicas que, contraditoriamente, vislumbramos grandes ameaças à integridade física da APA de Campinas. É importante lembrar, no entanto, que, seja de qualquer esfera pública, não há dispositivo legal que imponha à implantação dessas obras sem a respectiva aprovação.
É certo que o princípio da supremacia do interesse público é princípio base do Direito administrativo, mas isso não afasta a Administração de aplicá-lo de acordo com os demais princípios jurídicos, em especial, com os princípios da legalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, de forma que não se confunde o reconhecimento de utilidade pública, de interesse social ou mesmo de obra de menor impacto com a dispensa da aprovação pelo CONGEAPA, nas hipóteses estabelecidas pelas normas de regulamentação. Ao contrário, é o próprio Conselho que deve verificar o enquadramento deste reconhecimento à Lei e mais, estabelecer parâmetros para as intervenções.
Assim, consideramos que as obras públicas a serem executadas diretamente pelo Município ou por meio da Administração Indireta, sejam aquelas passíveis de AD, sejam aquelas compreendidas no rol de deliberações do CONGEAPA, devem também estar submetidas à celebração de Termo de Ajustamento de Conduta, desta feita, com o Ministério Público do Estado de São Paulo, por meio da Promotoria de Justiça Habitação de Urbanismo ou do Meio Ambiente, conforme o caso.
Nos casos em que a obra pública for de outro Ente Federativo ou de Concessionários de Serviço Público, o TAC será celebrado diretamente com o Município de Campinas.
3.      Conclusão
  
Em linhas gerais, após a análise da proposta de gestão da APA elaborada pela Walm,  consideramos que:
a) Somos favoráveis a relação de atribuições e responsabilidades atribuída ao OGTA e ao CONGEAPA, exceto em relação à presidência do Conselho;
b) A presidência do CONGEAPA deverá continuar a ser exercida por representante da sociedade civil, eleito por seus pares;
c) Deverão ser estabelecidos os critérios (por porte de atividade, nível de impacto e/ou outros) para classificar que tipo de protocolos de aprovação estarão dependentes da deliberação do CONGEAPA;
d) Fica, desde já, estabelecido que a implantação de novos parcelamento do solo ou condomínios, assim como a regularização fundiária dos existentes serão objeto da deliberação do CONGEAPA, independentemente dos critérios estabelecidos para a classificação de que trata a alínea anterior;
e) Deverá ser criada a CT de Aprovação e Monitoramento, responsável, entre outras, por dar parecer e decidir sobre as intervenções (obras ou atividades) que são objeto de deliberação do CONGEAPA, inclusive as obras públicas;
f)  A presidência da CT de Aprovação e Monitoramento será ocupada por representante da sociedade civil, eleito pelos seus pares;
g)  A decisão da CT de Aprovação e Monitoramento será submetida à ratificação do Plenário do CONGEAPA.
Por fim, qualquer proposta de alteração a ser realizada no zoneamento da APA deverá ser submetida à aprovação prévia do CONGEAPA e será objeto de lei, sendo vedados mecanismos de ajustes automáticos de perímetro, independentemente de percentual.
As alterações de zoneamento, quando couber, além de atender às exigências específicas do Conselho e da legislação ambiental, deverão observar o artigo 42-B da Lei 10.257/2001 – Estatuto da Cidade, sempre que, na prática, represente a ampliação das atividades urbanas ou a regularização das existentes.
CT Plano de Manejo; Coordenadora Angela Podolsky; 12/03/2018


[i]inTermo de ajustamento de conduta (TAC) e algumas observações sobre o seus limites” – Costa, Carlos Leonel. https://jus.com.-br/artigos/30469/termo-de-ajustamento-de-conduta-tac-e-algumas-observacoes-sobre-o-seus-limites