Vicente Andreu – Conselheiro Representante APA Viva no COMDEMA
Com o esvaziamento da proposta do “Nosso Cantareira” – que não é meu nem seu, mas deles – e a retomada da construção do Anel Adutor Regional (um sistema com 3 ramais de adutoras desconectados, um deles saindo da Barragem de Pedreira e chegando em Campinas) é impossível não associar esse ciclo desvairado ao calendário eleitoral, mais do que a qualquer racionalidade técnica, que comentaremos a seguir. O “Cantareira ´Deles” rendeu o que se pretendia: votos e apoio dos que se impressionam com obras, dos patridiotas tão em voga, neste caso na escala municipal, daqueles que enxergavam garantias de segurança hídrica que nunca existiram, daqueles que têm desprezo pelos patrimônios ambiental, cultural e histórico. Infelizmente, é ainda muito voto. Passadas as eleições municipais, em apenas 8 meses, volta a proposta da construção do anel adutor que, conceitualmente, é o antípoda da barragem de Sousas. Ou faz-se o anel adutor ou faz-se a barragem, muito embora sejam ambos inúteis para a pretensão do aumento da segurança hídrica de Campinas, além do altíssimo risco da barragem de Pedreira para a população daquela cidade; um crime. Como as eleições que virão são estaduais, nada mais apropriado do que colocar o tema novamente em destaque, agora com novo palanque.
Como o interesse principal é voto, me situo entre aqueles que ainda não acreditam que o Cantareira Deles foi abandonado, mesmo porque este empreendimento envolve, na minha opinião, interesses que continuam vivíssimos, em particular- mas não só – a especulação imobiliária na APA. Mas não há problema algum, para essas pessoas, apoiar por um tempo – o que nunca fizeram e se omitiram diante da incongruência entre as obras – a adutora salvadora, facilitando a vida para os aliados de sempre. Sinto muito, penso que é possível comemorar o “alegado” abandono da Barragem de Sousas, mas a idade – e outros atributos pessoais que cultivo prazerosamente – me leva a supor que pretendem fazer as duas obras!
Falemos do anel. Pelos dados do próprio DAEE a barragem de Pedreira não tem condições de suportar situações de intensa escassez hídrica. Dados do DAEE. Portanto, uma adutora partindo daquela barragem não terá água quando seu reservatório estiver vazio, exatamente nas estiagens. Também não acrescentará água que seja necessária, uma vez que a atual outorga do Cantareira – ah, os riscos que esta outorga corre – garante 10m³/s no ponto onde Campinas capta 4m³/s. Porém, para justificar os investimentos, terá que ser bombeado cerca de 1m³/s em grande parte do tempo. Também segundo dados obtidos dos estudos anteriores do DAEE, a tarifa a ser paga por esse bombeamento pode provocar um aumento de 30% na tarifa geral da Sanasa, pois terá que ser elevada a 176 metros. Quando o Cantareira Deles foi proposto, colocada diante deste dilema, a Sanasa não explicitava estas contradições, mas respondia apenas que não podia ficar esperando o governo do Estado. Vieram as eleições municipais. Cantareira Deles rendeu. Agora batem palminhas para a adutora salvadora de todas as crises, a maior obra hídrica em anos! Maior não será, mas tem grandes chances de vencer os títulos de proporcionalmente a mais cara.
Soluções evidentes como reduzir consumo (essa nem pensar!), proteger nascentes, matas ciliares e o que resta de matas em Campinas, ampliar reuso, pressionar por regras ainda mais igualitárias entre São Paulo e a Bacia PCJ em termos de segurança hídrica no sistema Cantareira, ainda são propostas que não ganharam a opinião pública, tão iludida de que obras salvarão a nossa cidade e o planeta.